lote_2
implantação
planta piso 0
planta piso 1
planta cobertura
[lote2, S. Mateus da Calheta, Angra do Heroísmo, 2005.2008]
arké/chorea
Sob a aparente desordem da cidade tradicional, existe, nos lugares em que ela funciona a contento, uma ordem surpreendente que garante a manutenção da segurança e a liberdade. É uma ordem complexa. Sua essência é a complexidade do uso das calçadas, que traz consigo uma sucessão permanente de olhos. Essa ordem compõe-se de movimento e mudança, e, embora se trate da vida, não de arte, podemos chamá-la, na fantasia, de forma artística da cidade e compará-la à dança – não a uma dança mecânica, com os figurantes erguendo a perna ao mesmo tempo, rodopiando em sincronia, curvando-se juntos, mas a um ballet complexo, em que cada indivíduo e os grupos têm todos papéis distintos, que por milagre se reforçam mutuamente e compõem um todo ordenado. O ballet da boa calçada urbana nunca se repete em outro lugar, e em qualquer lugar está sempre repleto de novas improvisações.
Jane Jacobs, Morte e Vida de Grandes Cidades, 1961
[City Life, Steve Reich, 1995, Ensemble Moderne]
para a Maria José
& now, live from firminy, france*
[Eglise Saint-Pierre, Le Corbusier, Firminy]
*Obrigado, Arqtº. Pedro Pinho Neves, pela foto e pela noite de Reyes.
suburbia - Grande Praga da Monotonia*
A Cidade-Jardim e os dogmas da utopia do homem dócil sem vontades individuais, conscientes e inconscientes. A submissão ao planeamento eterno e infinito. A catalogação interminável de todos os bocados das cidades, das vidas, que divide e compartimenta radiosamente o tempo e o espaço em “caixinhas” [via Abrupto].
*Jane Jacobs
it may be
Talvez nos tenhamos mostrado um povo tão displicente que não mais nos importamos com o funcionamento real das coisas, mas apenas com a impressão exterior imediata e fácil que elas transmitem.
Jane Jacobs, Morte e Vida das Grandes Cidades, 1961
[Queue, Frank der Salm, 2005]
a ecologia como religião, a estética como aberração [desperdício, já não dimensão]
[California Academy of Science, Renzo Piano, 2008]
subúrbio infinito
Andreas Gursky, Rurhtal
Aqui tudo parece
Que era ainda construção
E já é ruína
[...]
E o cano da pistola
Que as crianças mordem
Reflete todas as cores
Da paisagem da cidade
Que é muito mais bonita
E muito mais intensa
Do que no cartão postal..
Caetano Veloso
Há por todo o lado máquinas produtoras ou desejantes, máquinas esquizofrénicas, toda a vida genérica: eu e não-eu, exterior e interior, já nada querem dizer.
Gilles Deleuze e Félix Guattari
Não sem o cinismo com que constrói, Koolhaas devolve-nos ao exercício de pensar a cidade contemporânea no su texto "A Cidade Genérica". Ou à forma como experimentamos a cidade. Ou como, onde, decorre essa experiência urbana no nosso quotidiano. Porque antes de ser um texto sobre cidades, ou a cidade, é mais especulação sobre a experiência urbana. E a experiência, a subjectividade, não poderá ser idealizada sustentando-se em categorias puramente empíricas: não seremos todos hiper-viajados, connoisseurs do marisco mais saboroso, eruditos e ilustrados na história das cidades ou sequer na História. Mas o texto apresenta algumas hipóteses que importa verificar.
O significado desta condição urbana – numa altura em que mais de metade da humanidade habita em cidades – tem o alcança identitário. Será talvez este o principal tema da “cidade genérica”. E cidade é aqui não uma geografia, uma sociologia, uma economia - será tudo isso e, evidentemente, mais – mas é uma condição. Um a priori que enforma os indivíduos e conforma as suas identidades: o tráfico permanente das imagens; o déjà vu eterno da experiência do quotidiano – as mais radicais experiências (trágicas?) serão asspeticamente resguardadas pelos dispositivos da segurança vigiada -; a amnésia em luz néon; a mecânica do desejo do ser único e ao mesmo tempo global; a paranóia do futuro no minuto cessante; o ar-condicionado que abriga do buraco do ozono; a infinita “fachada-cortina” que induz a florescente indústria do silicone tapa-juntas (“o triunfo das juntas sobre a integridade dos materiais”).
A realidade de Koolhaas apresenta será anódina e asséptica, onde a experiência será apenas simulacro e o futuro a condenação a uma forçada felicidade em ar-condicionado – vulgarizada pela banalizadora e infinita repetição.
“A Cidade Genérica”, publicado em 1997, estará mergulhado no optimismo inebriante dos anos noventa e no apogeu das dotcom’s e dos índices Dow Jones. Como um Fukuyama urbano que anuncia o fim da cidade porque é agora tudo cidade e nos remete à condição da felicidade plastificada de um subúrbio infinito e global. Sem estória nem estórias, num movimento perpétuo de reescrita da História, disneylizando progressivamente as identidades.
Em dez anos assistimos à derrocada do optimismo perpétuo e radical. Entretanto Koolhaas dedicou-se a dar espaço (room) à condição “genérica”. Produzindo ícones atrás de ícones, postais atrás de postais, reproduzindo e densificando o vazio, que é a categoria essencial da “cidade genérica”. Como se a globalização nos deixasse estranhos em toda a parte e estando em casa em qualquer lugar do planeta. A dissolução da physis deixaria os arquitectos longe de qualquer melancólica noção de cidade, bairro, praça, espaço público, de História, de moral. Abandonados apenas a impulsos estéticos. Aqui, um frenesim de aparências e ilusões.
Irónico? Cínico?
¥€$
[La ciudad genérica, Rem Koolhaas]
mon oncle*, monsieur koolhaas
La Maison à Bordeaux, pela senhora da limpeza.
[Koolhaas Houselife, Ila Bêka & Louise Lemoine, 2008]
*D'après Jacques Tati.
alterações climáticas
Plano, Illinois, submetido a sessenta anos de construção massiva. Em leito de cheias.
[Farnsworth House, Mies van der Rohe, 1945-51]
per scapere
O que existe de "natural" na natureza, a sua sensualidade imediata, só é entendido enquanto enigma pelo artifício de uma construção mental.
[...]
Algo parecia demasiado, por isso nenhuma história pode sobrepor-se. Algo como a invenção de uma pintura de paisagem. O assunto "oculto", que se ausenta assim da representação colorida do quadro, manifesta na sua nudez o facto-pintura, sem o álibi ilusório de um qualquer assunto. O facto-pintura - o surgimento conjunto da paisagem e da pintura.
[A Invenção da Paisagem, Anne Cauquelin]
paveseana#2
A obra equivale à oração, porque nos põe em contacto com os que dela tirarão proveito. O problema da vida é, portanto, o seguinte: como romper com a nossa solidão, como comunicar com os outros.
[Cesare Pavese, Ofício de Viver]