E o que é real só o é por uma vez
E num só lugar
[T.S. Eliot, Quarta-Feira de Cinzas]
[...] a escrita é inicialmente a fala de alguém ausente, o abrigo é um substituto do útero materno, a primeira morada, provavelmente desejada ao longo de toda a vida, onde o homem se sentia bem e seguro.
Podemos acrescentar aqui o interessante caso da busca da felicidade na contemplação da beleza, onde quer que ela se apresente aos nossos sentidos e ao nosso juízo, a beleza das formas e gestos humanos, de objectos da natureza e paisagens, de criações artísticas e mesmo científicas. Esta atitude estética em relação ao sentido da vida oferece pouca protecção contra a ameaça do sofrimento, mas serve em grande medida como sua compensação. O prazer proporcionado pela beleza reveste-se de uma qualidade perceptiva peculiar, levemente embriagante. Não é claro qual seja a utilidade do belo nem a sua necessidade civilizacional, e no entanto não podia deixar de estar presente na nossa cultura.
Sigmund Freud, O Mal-Estar na Civilização
Se pretendemos representar espacialmente a sucessão histórica, só o podemos fazer por uma justaposição no espaço; o mesmo espaço não pode ser ocupado por duas coisas distintas ao mesmo tempo. A nossa tentativa parece um jogo ocioso; a sua justificação é apenas esta: mostra-nos como estamos longe de abarcar numa imagem todas as características da vida mental.
Temos ainda que responder a uma objecção. Poderá perguntar-se por que razão escolhemos precisamente o passado de uma cidade como termo de comparação com o passado mental. A suposição de que todo o passado e conservado só é válida também para a vida mental apenas na condição de que o órgão da psique permaneça intacto, de que o seu tecido não seja danificado por traumas ou inflamações. No entanto, as influencias destrutivas equiparáveis àquelas causas patológicas estão sempre necessariamente presentes na história de qualquer cidade, mesmo de uma cidade que, como Londres, praticamente nunca foi invadida por inimigos. O desenvolvimento perfeitamente pacífico de uma cidade inclui a demolição e substituição de edifícios, e é por esta razão que o exemplo de uma cidade não é apropriado para a comparação com um organismo mental.
Sigmund Freud, O Mal-Estar na Civilização
O templo, no seu estar-aí [Dastehen] concede às coisas o seu rosto e aos homens a vista de si mesmos.
Martin Heidegger, A Origem da Obra de Arte