estrada nacional#13

É o cepticismo, a atitude que se impõe.

George Steiner, No Castelo do Barba Azul



Revolver a superfície plana das imagens que a arquitectura também constrói e veicula, é trabalho ontológico da própria arquitectura. Como produtora de cultura, a arquitectura, estabelecerá relações com o tempo, os lugares, as memórias, a matéria. Será o elo concatenador do indivíduo com o seu espaço e tempo. O veio de transmissão, inicial e quotidiano, do homem com o mundo, com o passado, o presente e o futuro. Daí ser ela também objecto de desejo. E de consolo. Uma proposta de pensamento, “exterior às palavras”, originário tanto da razão como do coração, das ideias e da matéria.
Acontece curto-circuito, a arquitectura torna-se instrumento de representação. Uma casa são as aspirações do indivíduo moldadas pela matéria. O desejo é a vontade de um mundo. O mundo torna-se plural com a manifestação das diversas vontades. A arquitectura abre o(s) mundo(s). É o mister do arquitecto abrir o mundo.
A abertura é o devir de todas as possibilidades. O novo absolutamente novo e o antigo re-construído à luz contemporânea são os refúgios recorrentes. O espanto do original ou o reconhecimento do autenticado por gerações passadas, são os dois lados de um plano impaciente, como uma folha branca à espera das palavras, que nos deixa suspensos. Com a avidez nervosa das novas formas ou a pretensa unissonância do passado ordenado, eterno jardim, esforçamo-nos por alguma segurança reactiva com que confrontamos o abismo do tudo-possível.
O compromisso do arquitecto será ético. A radicalidade do ofício será a da inteligência com que se administrará os materiais que se dispõem sobre o estirador: memórias, desejos, técnicas, tecnologias, matérias, necessidades e possibilidades, adequação.
Não coabitando pacificamente com o presente, ou humilhamos o passado ou alimentamos a expectativa de resgate pelo futuro. Incapazes de (nos) entendermos (n)o hoje, ou sonhamos com as redentoras tecnologias do amanhã ou glorificamos o passado agora mítico. E elide-se qualquer possibilidade da arquitectura ser.


[Moradia Unifamiliar, Fontaínhas da Serra, Atouguia, Ourém, autor desconhecido]


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