Exmo. Vereador José Sá Fernandes,
CC: Exmo. Presidente António Costa; Exmo. Vereador Manuel Salgado; Exma. Senhora Vereadora Helena Roseta
É do e no espaço público que nascem as ideias e é por isso que o desejo de controlo político do mesmo é uma constante em todas as épocas e regimes. É o espaço público o lugar privilegiado da democracia. E da liberdade. E a liberdade só o é exercendo-se. É uma prática que necessita de repetição. Sob pena de se consumir no esquecimento. E recordamos a história do nosso país e sabemos o que ela custou a conquistar.
A praça é o lugar simbólico da democracia. É o lugar – físico - da discussão, do consenso e do contraditório. Se a praça é o lugar da prática da liberdade, em arquitectura, em cidade, os seus limites serão os da casa e das escolhas individuais. É nesses limites, ainda que difusos e muitas vezes conflituais, que fazemos o caminho das nossas escolhas individuais. Numa cidade vive-se entre o espaço público e o espaço privado e doméstico. Não se diz que a nossa liberdade termina onde começa a dos outros?
A política autárquica, numa democracia liberal, não será mero balancete ou deve e haver. Será antes um percurso de escolhas que articulem os interesses privados com o interesse público, tendo como fim último o fortalecimento da liberdade. À gestão – palavra equívoca – de uma cidade deverá presidir, antes de mais, uma ideia de liberdade, de convívio das diferenças, de incremento da diversidade. É esta a riqueza das cidades e que a nenhuma excepção se deverão sujeitar e subjugar.
Recordo a campanha de V. Excia. à Presidência da Câmara Municipal de Lisboa, onde apelava a novas formas de cidadania. De participação na construção de uma cidade mais justa, mais democrática. Mais livre. E se recordo a sua campanha faço-o em confronto com decisões políticas de V. Excia, contraditórias com o seu discurso. São decisões lesivas dessa cidade livre que ambicionamos em Lisboa.
O encerramento, ainda que temporário, da Praça das Flores, alugada, mercantilizada, a uma marca de fabricante de automóveis, é simbólica do desprezo que é concedido ao espaço público. E da sujeição da política – polis – aos interesses privados, ainda que legítimos. O desdém institucional pelos cidadãos não é, também, de menor gravidade. Se a ideia de V. Excia. de “democracia participativa” passa pela exclusão dos cidadãos das decisões, creio que labora num erro que fere a cidade e a política. Se o conceito de V. Excia de cidade e cidadania passam pela segregação e pelo ressentimento – que na prática é o resultado imediato desta decisão de vender por trinta dinheiros a Praça das Flores – é lamentável. E politicamente hipócrita.
Há bens e valores que se devem manter acima de qualquer tráfico. A liberdade e a cidade não são mercantilizáveis. A justificação de contrapartidas pelo arranjo da Praça das Flores é intolerável, se o resultado é a exclusão, ainda que temporária, dos cidadãos daquela parcela de espaço público.
Endosso a V. Excia. responsabilidades políticas e materiais que resultam desta decisão desastrosa, lesiva da cidade de Lisboa, e do exercício da cidadania.
O espaço público não é mero palco para a encenação de um mundo de mortos que resulta destes pequenos estados policiais que nos vão surgindo pelas ruas de Lisboa.
Subscrevo-me atenciosamente,
João Miguel Amaro Correia
B.I. nº 10321780
Membro inscrito na Ordem dos Arquitectos nº8763
p.s. Em anexo, junto documentos fotográficos que certamente cobrirão V. Excia. de arrependimento.
praça das flores de aço
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6.6.08
Caro João, há uns dias que estou para escrever sobre o assunto...
APOIADO!
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gab.pcp@cm-lisboa.pt
gab.cpl@cm-lisboa.pt - 7.6.08
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7.6.08
Só quem é morador na zona (como eu sou há dezenas de anos) pode avaliar a extensão do desaforo. Estamos a ser impedidos (por grades e dezenas de polícias e "seguranças") de aceder a um espaço público que sempre nos pertenceu e passou agora a ser exclusivo dos convidados de uma marca de automóveis. Há ruas cortadas, lugares de estacionamento eliminados, acesso a residências dificultado, batuque musical de fazer estremecer as paredes, etc.. Só visto. Parece que, em troca desta ofensa à população local, o autarca responsável pelo desconchavo contratou com a automobilística marca o arranjo do jardim. Ao que chegámos!
Será que o manifesto abuso de poder vai ficar sem castigo? -
12.6.08
Isto vem na grandiosa tradicao das camaras municipais e juntas de freguesia instalarem altifalantes a debitar publicidade e musica dias inteiros, no Natal, no Verao, quando seja. Como se as pessoas nao tivessem direito 'a normalidade, sem haver sempre alguem a impor uma m***a qualquer. Eventos, musica, publicidade, foguetes.