Despois de Raúl Lino e a questão identitária, a partir do conhecimento do lugar, da adequação dos materiais, de uma sensibilidade local mas cosmopolita no gosto, Fernando Távora desenvolve uma aproximação crítica ao “regionalismo”. Este exercício crítico retoma o tema da identidade da arquitectura portuguesa e da sua articulação com o cânone modernista, à época no seu paroxismo, naquilo que se poderá considerar uma ética do construir. Data de 1947 O Problema da Casa Portuguesa. É também uma tentativa de resistência ideológica e cultural que abre caminho para um regionalismo crítico avant la lettre.
A sugestão da re-leitura do catálogo modernista à luz daquilo que seriam as especificidades dos lugares, gerou arquitecturas que recorriam sem pudor às capacidades expressivas dos materiais do tempo. Do betão armado à crença ainda viva da capacidade da arquitectura concorrer para a transformação social.
Ainda que tímidos, mais ou menos complexados, vamos encontrando pela paisagem alguns exemplos dessa tentativa de reacção cultural ao oficioso discurso arquitectónico erguido da tresleitura de Raul Lino e que propunha um modelo “universal” do que seria a casa portuguesa.
E ao contrário de hoje, onde se reproduzem os exemplos de um arcaísmo transmutado em modernidade, de plástico, de “volumetrias puras”, brancas, e da respectiva pala sobre o vão – que de repente se tornou a citação mais banalizada da nossa produção corrente recente, mas isso será todo um outro post – destituídos de qualquer reflexão e crítica culturais, mergulhados numa espécie de pragmática industrial do que é ser moderno ou contemporâneo.
Retomemos Fernando Távora, recuperemos a arquitectura como um “um trabalho feito pelo homem para o homem”.
[Mira d'Aire, autor desconhecido]