a pedra é mais pedra que dantes

Já não compreendemos em geral a arquitectura; pelo menos, seguramente não da maneira como compreendemos a música. Ao crescer, saímos da simbólica das linhas e figuras, tal como estamos desacostumados dos efeitos sonoros da retórica e já não bebemos essa espécie de leite materno da cultura desde o primeiro instante da nossa vida. Num edifício grego ou cristão, primitivamente, tudo significava algo, e, na verdade, em relação a uma ordem superior das coisas: essa atmosfera de uma inesgotável significação envolvia o edifício, à maneira de um véu mágico. A beleza só secundariamente entrava no sistema, sem afectar o sentimento fundamental do numinoso-sublime, do consagrado pela proximidade dos deuses e pela magia; a beleza, quando muito, mitigava o temor — mas esse temor era, em toda a parte, a condição prévia. Que é para nós, agora, a beleza de um edifício? O mesmo que o belo rosto duma mulher sem espírito: qualquer coisa parecida com uma máscara.

F. Nietzsche, Humano, demasiado humano


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