estrada nacional#5


Uma casa é um sinal de cultura, a projecção do homem no meio e ponto de referência na paisagem. Qualquer obra de arquitectura ou cidade são no espaço. São acontecimentos que têm lugar no espaço, que estabelecem relações com o lugar onde se situam. E o lugar é a síntese dessa incidência humana sobre a natureza e a própria natureza, com a qual o homem trava uma luta para a poder habitar.
À imagem arquitectónica importa ir além da mera representação técnica. As imagens, como fim-em-si, como fantasmas, contradizem os propósitos da arquitectura e da sua materialização. São espectros que ensombram o imaginário dos arquitectos, sem qualquer propósito que não o da mera especulação – ainda que necessária. Genuinamente a muitas delas subjaz intencionalidade reflexiva, mas da hiper-reprodução electrónica das imagens resultam quase sempre simulacros ou fortuitos e frívolos gestos egotistas dificilmente mais que vazios. Sobra algum optimismo, resultante do acesso à arquitectura
gerado pela dinâmica comunicacional, de um público mais alargado e menos ilustrado no discurso disciplinar.
Seguindo a pista de Foucault, a história é, também, uma forma de controlo e domesticação do passado. Os edifícios – e as cidades – são susceptíveis do mesmo revisionismo interpretativo e de uma contínua reinvenção e reinterpretação. Construímos o que vemos e experimentamos e construir é materializar o nosso entendimento do mundo. Ou a tentativa de lhe encontrar uma ordem e dar sentido.
A voz comum do tempo e do ser, que se re-constitui em símbolos inaugurais, aquém da racionalidade, numa representação para além do seu significado imediato, determina uma sintaxe que se expressa inconscientemente. O Partenon, as Ordens Clássicas, a necessidade de estruturar coerentemente os elementos, respondem ao desejo de conformidade com o mundo – harmonia, proporção, ritmo, unidade -, justificam o nosso desejo de que essa coerência seja bonita. E implicam que o significado experimentado seja “traduzido” para um outro suporte, a materialidade da arquitectura.
O pastiche irrisório, a colagem vernacular tosca, a citação incongruente, a repetição irreflectida, negligenciam o mister arquitectónico. Ao invés de se libertar o significado imediato da coisa, tornando-a num objecto cultural passível de novas leituras significantes, aprisiona-se, pobre, deslocada, descontextualizada, e pantomina. Comédia, ainda assim, vital.

[Vilar dos Prazeres, Ourém]


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