bate-chapas: a reconquista

O trânsito que cruza(va) a Ribeira das Naus até ao Campo das Cebolas é maioritariamente de passagem e de atravessamento da cidade. A manhã de sol de hoje provou-o à saciedade e revelou o fracasso dos oráculos dos nossos sacrossantos automóveis. Por uma vez, e espera-se que para exercício futuro, a cidade não é “desenhada” em função das acessibilidades, funcionalidades, e outros ismos que carregam consigo o apego ao egoísmo anti-urbano, anti-democático.
Há qualquer coisa de reconquista quando se atravessa para o Cais das Colunas sem sermos gaseados por combustível queimado, quando nos sentimos acompanhados por estranhos mesmo que não nos atrevamos a desejar o V Império nem o regresso de Sebastião, quando voltamos a experimentar simultaneamente o desconforto e o esplendor e o sublime do Terreiro do Paço. A Lisboa dos bocados urbanos circunscritos pelas auto-estradas do desenvolvimentismo provinciano pode agora transformar-se numa cidade de civilização e de liberdade.
Por disperso e anárquico que seja o processo de planeamento do que hoje se iniciou, deu-se a primeira martelada na chapa da ditadura automóvel na cidade de Lisboa. Talvez ainda não pelas razões certas, ou por todas as razões certas, podemos começar a desejar uma cidade em que se consiga habitar o e no espaço público, onde, por exemplo, os amantes deixem de marchar em fila indiana e possam caminhar lado a lado, de igual para igual, entre eles e a cidade, sem o entulho tecnológico e social da omnipresente viatura individual. E a quem queira esperar D. Sebastião, que se sentem no Cais das Colunas, esperem por um dia de nevoeiro, enquanto a nós, os mais prosaicos e triviais, é-nos suficiente matéria de felicidade o sol e a cidade.


about this entry


  1. Anonymous 17.2.09

    Para ti duas palavras entre aspas
    "Pançudo das Bifanas". Esse belo "Restaurante" à beira Tejo.

    Marta Sousa Freitas

     
  2. um parvo qualquer 19.2.09

    olha, aqui também te conhecem por pançudo das bifanas?

    gostei da imagem do Sebastiaozinho a chegar de cacilheiro, e dos amantes em fila indiana, se bem que a crítica não deve atingir a todos, há quem prefira por trás.

     
  3. Marta 19.2.09

    Ó sr. "um parvo qualquer" mas isso é nome de blogger que se apresente????
    Queres ver que tb é arquitecto. Pois se o for, a definição adequa-se.

    Marta Freitas

     
  4. um parvo qualquer 20.2.09

    arrogância de classes assim logo pela fresquinha?

    foi o nome que os meus pais me deram sra. "Marta Sousa Freitas"

     
  5. Anonymous 20.2.09

    Nâo é arrogância é fatalismo, ou melhor é fado. "Tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado." (Amália Rodrigues).

    Marta Freitas

     
  6. Pedro M. Fonseca 25.2.09

    Isso dos "amantes a marchar em fila indiana" é efectivamente algo que me preocupa. Lisboa não gosta de namorados de mão dada ou abraçados: A cada 10 metros arranja maneira de os separar. Depois queixem-se do infortúnio!