a era do vazio


O pós-modernismo não passa de uma ruptura de superfície, conclui a recilagem democrática da arte, continua o trabalho de reabsorção da distância artística, leva até ao extremo limite o processo de personalização da obra aberta, fagocitando todos os estilos, autorizando as construções mais divergentes, desestabilizando a definição da arte moderna.

Gilles Lipovetsky, A Era do Vazio


A questão pós-moderna levanta com especial acutilância o instinto estético da arquitectura e a sua recepção pública. Fredric Jameson, em The Cultural Logic of Late Capitalism, sugere a nova apetência dos públicos massificados pela arquitectura através da importância das diversas formas de representação de classe, pelo simbolismo que cada edifício pode sustentar do seu promotor, e, de certa forma, pela atenção com que as massas [consumidoras] reconhecem à arquitectura como modeladora da “paisagem visual”. Esta visão oferece-nos claramente a distinção entre paisagem, do domínio do trabalho disciplinar, e “paisagem visual”, como consequência óbvia da arquitectura na vida e no quotidiano de qualquer indivíduo.
Tomás Taveira terá sido o protagonista do último grande debate público sobre o carácter da arquitectura. Na já distante década de 80, com o complexo das Amoreiras. O modelo era novo, o discurso, para o bem e para o mal, “irreverente”, num país que lentamente se abria à “Europa” e numa disciplina entrincheirada entre o vanguardismo estético dos arquitectos, a insuficiência cultural dos promotores, e o desprezo distraído dos “consumidores” de arquitectura.
As Amoreiras tornam-se simbolicamente o momento de assunção, no contexto doméstico, do carácter público, ou se se quiser, social, da arquitectura. O mérito é do arquitecto e da sua capacidade de sincronizar o tempo e o debate arquitectónico internacional da época com o contexto português. Terá sido o momento alto da carreira de Tomás Taveira, onde tenha sintetizado o seu pensamento arquitectónico com mais acutilância. Mesmo que envolto em polémica.
Mas a fragilidade de uma síntese arquitectónica radicada na premência e manipulação de imagens - históricas e da sociedade de consumo – atravessa facilmente a ténue linha entre um pensamento arquitectónico sério e radicado numa revisitação histórica da disciplina e um populismo vazio à mercê de interesses – legítimos, diga-se – de promotores mais interessados com a auto-representação e menos com a própria matéria arquitectónica.
E é a futilidade que domina a produção de Tomás Taveira de então para cá.


[Tomás Taveira, Saldanha 25, 2008]


p.s. Corre nos mentideros a exigência da Câmara Municipal de Lisboa da utilização de um revestimento mimetisando o Atrium Saldanha [Ricardo Bofill e João Paciência], que confronta o edifício de Tomás Taveira. Penosa, esta incursão burocrática dos serviços municipais ao estirador do arquitecto. Fosse o edifício revestido com a festiva paleta cromática de Tomás Taveira e o vazio seria um pouco menos oco.


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  1. Anonymous 15.12.08

    Até para ser realmente mau - por mais vago que isso seja - é preciso dedicação: não há cor,tem pedrinha branca,vidro nas varadas, caixilho que sem ser um primor, escapa; se fosse um horror pelo menos podia falar-se na personalidade - por mais vago que isso seja.

     
  2. Anonymous 16.12.08

    É horrível.

     
  3. tms 27.12.08

    Dá uma vista de olhos nisto http://www.ateliermob.com/194996.html, que és capaz de achar graça.