o visível e o invisível


Seis católicos, austríacos, falam para a câmara como se se dirigissem a Deus. Ou falam com Deus divididos pela câmara.
Um a um, os crentes percorrem o caminho até ao altar - o lugar de Deus ou da câmara? - e rezam. De fora da igreja apenas breves takes da vida exterior de cada um deles. Dentro da igreja, Jesus é o confessor, o amante, o psicólogo. Que não se vê.
A câmara minimalista é omnipresente e revela a angústia emocional das seis vidas. Não sem algum incómodo para o espectador, que permanece na dúvida: “Ninguém sabe das minhas angústias como Tu”, diz a mulher de meia idade em confidência assombrada pela presença da câmara.
Nas igrejas vazias, mais vazias que nunca, resta o indivíduo, sozinho, no desespero da busca de uma maior realização nas suas próprias experiências humanas.
Imperceptivelmente, no espaço vasto e vazio frente ao altar, cada um dos seis é quase como uma peça no décor que é a igreja. Através de uma visível correspondência entre o modo como cada um se dirige a Jesus – à câmara? - e a qualidade espacial de cada uma das igrejas.

No fim volta-se ao início e permanece a dúvida, debaixo da severidade da câmara e da densidade íntima e confessional do que se ouve e se vê, se tudo não passou de um entretenimento cínico do realizador, na ambiguidade entre a câmara e Deus e o que se diz pelo meio.


[Jesus, Du weisst, Ulrich Seidl, 2003]

Com especial agradecimanto ao David Fonseca.


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